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quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Trabalho e escravidão


É recente a polêmica acerca da decisão de Amazon, que visando acelerar a busca e entrega por produtos armazenados pelos seus funcionários, passou a impor-lhes o uso de uma pulseira wireless, capaz de monitorar com precisão todos os gestos realizados, vibrando para orientá-las na direção certa e, de fato, controlando todos os seus movimentos. O sistema é baseado em três fatores: 1) a pulseira usada pelo trabalhador que se comunica com os 2) transdutores ultrassônicos posicionados no meio ambiente e 3) um “módulo de gerenciamento” que permite movimentos de rastreamento. O próximo passo seria a automação total dos processos que, então, transformaria os homens em máquinas controladas [1]. 

Outro assunto polêmico é o texto publicado no jornal italiano Il sole 24ore, cujo titulo é indicativo: “Reintroduzir a escravidão seria ou não uma opção para sociedade moderna?” [2].
Tudo isto nos alerta sobre o fato de que, atualmente, o sentido do trabalho humano como ação, no sentido empregado por Hannah Arendt, ou seja, como expressão da liberdade criativa do sujeito, corre o perigo de ser reduzido a labor, ou seja, gesto mecânico e alienado do próprio sujeito que o realiza [3]. Estaríamos voltando, assim, a formas sofisticadas de escravatura que se somariam à permanência nefasta de formas tradicionais de trabalho escravo no Brasil e no mundo de hoje [4].
Neste contexto, vale lembrar aquilo que vem assinalado pelo documento pontifício Gaudium et spes
A atividade humana, do mesmo modo que procede do homem, assim para ele se ordena. De fato, quando age, o homem não transforma apenas as coisas e a sociedade, mas realiza-se a si mesmo. Aprende muitas coisas, desenvolve as próprias faculdades, sai de si e eleva-se sobre si mesmo. Este desenvolvimento, bem compreendido, vale mais do que os bens externos que se possam conseguir. O homem vale mais por aquilo que é do que por aquilo que tem. Do mesmo modo, tudo o que o homem faz para conseguir mais justiça, mais fraternidade, uma organização mais humana das relações sociais, vale mais do que os progressos técnicos. Pois tais progressos podem proporcionar a base material para a promoção humana, mas, por si sós, são incapazes de a realizar.
A norma da atividade humana é pois a seguinte: segundo o plano e vontade de Deus, ser conforme com o verdadeiro bem da humanidade e tornar possível ao homem, individualmente considerado ou em sociedade, cultivar e realizar a sua vocação integral.
[5]

Notas:
[1] Cf. BORGES, Larissa Cardoso. Amazon gera polêmica ao patentear pulseira para usar em seus funcionários. TecMundo, 13 de fevereiro de 2018. Disponível em: <https://goo.gl/oKCQG9>. Acesso em 14 fev. 2018.
[2] VERGA, Enrico. Reintrodurre la schiavitù è o no un'opzione per la società moderna? Econopoly, 26 de janeiro de 2018. Disponível em: <https://goo.gl/dRvPgn>. Acesso em 14 fev. 2018.
[3] Cf. ARENDT, Hannah. A condição humana. 10a ed. Rio de Janeiro: Forense Editora, 2007.
[4] Cf. http://trabalho-escravo.info/
[5] PAULO VI. Constituição Pastoral Gaudium et Spes: sobre a Igreja no mundo atual. 7 de dezembro de 1965, 35. Disponível em: <https://goo.gl/ccZ2ww>. Acesso em 14 fev. 2018.

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