terça-feira, 7 de julho de 2015

A ecologia e a lei natural


A questão ecológica tem duas dimensões complementares para o homem moderno. Ambas são abordadas na Laudato si’ [1], a encíclica “verde” do Papa Francisco. A mais evidente refere-se à necessidade urgente da humanidade inteira se comprometer com a conservação do meio ambiente, para garantir um mundo habitável já num futuro próximo.
Outro aspecto, menos evidente, refere-se à “crise de sentido”, a que os bispos latino-americanos já se referiam no Documento de Aparecida [2]. O tema é central nos capítulos 3 (“A raiz humana da crise ecológica”) e 6 (“Educação e espiritualidade ecológica”) da encíclica
A sociedade moderna colocou o homem no centro do universo, como se a sua vontade pudesse dar a última palavra sobre a sua vida. Este “antropocentrismo desordenado” (cf. Laudato si’ §§ 68, 118-122) leva à perda de sentido da vida, pois o sentido é sempre relação com um outro e leva a perceber os próprios limites e a dependência do outro.
Para a maioria dos povos e civilizações, o sentido era dado pelo reconhecimento de um Criador. Daí nascia uma ética religiosa (que, como a palavra diz, “religa” todas as coisas na divindade). A cultura moderna, insurgindo-se contra qualquer coisa que estivesse acima da própria vontade, perdeu também a possibilidade de construir uma ética verdadeiramente humana, centrada na realização da natureza da pessoa, e não nas ideologias hegemônicas.
Mais poder, mais autonomia, maior felicidade. Mas esta equação não se mostra verdadeira na prática. Vivemos num mundo onde a ânsia por felicidade parece ser cada vez maior, mas onde as pessoas sabem cada vez menos como fazer para serem felizes.
Ao longo da segunda metade do século XX, os movimentos ecológicos representaram a busca, na sociedade moderna, para reencontrar um sentido ordenador da realidade e uma ética que novamente religasse as pessoas entre si, com os demais seres vivos e com todas as coisas. A natureza, o ecossistema, a biosfera, com suas leis eternas e inevitáveis, pareciam poder ocupar o vazio deixado pela negação de Deus e da religião.
Mas a natureza é um dom de Deus e não o próprio Deus. Chegamos assim à situação atual, onde acontecem coisas como alguém pensar que é importante preservar os ovos das tartarugas-marinhas, mas não é necessário defender as crianças que estão por nascer (cf. Laudato si’ § 120), ou que as regras da natureza valem para todo o cosmo, mas não valem para a diferenciação entre homem e mulher.
A questão ecológica nos obriga a reconhecer que existe uma “lei natural”, a qual temos que seguir se quisermos ser felizes – como lembra a doutrina da Igreja. Laudato si’ nos lembra que o reconhecimento do sermos amados por Deus nos leva a amar a todos e a toda a natureza. Precisamos deste amor para reconhecer as leis dos ecossistemas e da nossa própria natureza humana.

Notas
[1] FRANCISCO. Carta Encíclica Laudato si’, sobre o cuidado da casa comum. 24 de maio de 2015. Roma. Disponível em: <http:// w2.vatican.va/ content/ francesco/ pt/ encyclicals/ documents/ papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html>. Acesso em 05 jul. 2015.
[2] CONSEJO EPISCOPAL LATINOAMERICANO. V Conferencia General del Episcopado Latinoamericano y del Caribe – 13 a 31 de mayo de 2007: Documento Conclusivo. Bogotá: Paulinas, 2007. Disponível em: <http://www.celam.org/aparecida.php>. Acesso em 10 ago. 2008.

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