Por Luigi Giussani
Wolfgang Amadeus Mozart
Concerto para piano e orquestra n. 20, K 466 1
Estuda-se
bem aquela música que entra como por osmose na nossa alma e não aquela que se
estuda com a batuta (dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó). Que caminho infinito,
que caminho longo, que trajeto sem fim, cheio de pedras, deve percorrer 99% das
pessoas do mundo para chegar à ternura da inflexão musical do viver – e, assim,
da percepção de si e dos relacionamentos –, da qual o Concerto n. 20 para
piano, de Mozart, é o maior exemplo que temos na história.
Mas de
onde nasce esse sentimento de si e da existência tão ardente, vivo e, ao mesmo
tempo, tão comovido?
Experimentalmente,
é mesmo verdade que a atividade original do homem é reconhecer e constatar. Não
há nada mais intenso do que a atividade de alguém que, com os olhos
arregalados, olha um quadro ou um rosto que lhe agrada; não há nada mais
entusiasmante, mais concentrado, mais vibrante, quer dizer, mais ativo. Creio
que a criação artística não seja mais do que isso. Aliás, a criação artística –
a meu ver – depende disso, é uma trabalhosa resultante disso, porque a
moralidade é “tender para”. “Tender para” quer dizer afirmar um Tu, é a suprema
gratuidade que faz abraçar tudo.
Reduzir-se
a ouvir a proibição ou a respeitar uma lei sem tender a surpreender o
pressentimento da posse de algo maior é como o solfejo. Quando, ao invés, se
vislumbra o segundo nível, como neste concerto de Mozart… é uma coisa do outro
mundo. Você se torna melhor. Assim, mesmo na dramaticidade, a certeza e a
letícia, a alegria e a paz constituem o sentimento predominante que o homem tem
de si.
A
Beleza é o nexo entre o presente e o eterno, por isso o presente é sinal do
eterno, é o início do eterno, é experiência inicial do eterno, por isso o gosto
da vida começa a palpitar com certa nota inconfundível, a nota do permanente: a
justiça, o amor. Em uma palavra: a exigência de satisfação total, a exigência
de realização do eu (é somente por causa de uma presença alegre que o nosso
coração se torna, por sua vez, alegre: por nossa conta, a felicidade não pode
florescer em nós). É esta a tensão interior que vibra na melodia tão
fascinante, tão comovente, tão humana e tão divina, porque canta uma esperança
que não morre.
Nota : [1] CHIERICI, Sandro; GIAMPAOLO, Silvia (orgs.). Spirto gentil: um invito all’ascolto dela grande musica guidati da Luigi Giussani. Milão: BUR Rizzoli, 2011, p.63-64. Traduzido sem revisão dos autores por Fábio Henrique Viana.
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