Há um elemento que aproxima a violência protagonizada por sujeitos ligados à organização do ISIS e a que acontece em nossas periferias e cidades latino-americanas protagonizada por sujeitos ligados à organização do narcotráfico: de modo geral seus protagonistas são jovens; na grande maioria se trata de jovens que vêm de contextos sociais e familiares que vivenciaram o desenraizamento de seu mundo de origem, desenraizamento de natureza social e cultural. Ambos vivem em periferias marginalizadas do Novo e do Velho Mundos, ao lado de contextos urbanos marcados pelo consumismo, pela posse ávida e desenfreada do dinheiro, pela evasão no lazer e pelo individualismo egoísta e cínico. O desenraizamento que as famílias destes jovens vivenciaram em muitos casos é o preço pago para que o poder (especialmente econômico) dos outros se mantenha.
Irã, Iraque, Mali, Nigéria e outros países da África e do Oriente Médio são locais onde as grandes potências mundiais que lideram a sociedade ocidental pós-moderna exerceram (e procuram continuar exercendo) uma exploração sistemática dos recursos naturais e humanos, herdeira dos antigos colonialismos, se apossando de ouro, petróleo, urânio, minerais e terras; e depois da força de trabalho das populações que, obrigadas a emigrar pelas condições de depauperamento geradas pela referida exploração, vivem nas grandes periferias urbanas do Ocidente.
Algo semelhante acontece no Brasil, onde a migração forçada pela pobreza e pela exploração gerou os bolsões de miséria nas periferias de nossas grandes cidades, onde favelas e cortiços coexistem com condomínios fechados de alto padrão, impenetráveis e soberbos em sua imponência; onde alguns jovens frequentam locais de lazer de luxo e compram em shoppings enquanto outros vivem de modo desumano ou jazem em ruas e praças destruídos pelo uso do crack. Não seria este entrincheiramento em nome da segurança e do bem-estar algo análogo ao entrincheiramento de vários países da União Europeia que ergueram barreiras para não receber imigrantes e refugiados? Que oportunidades de convivência e reciprocidade criaram para que estes jovens pudessem pensar e atuar para um futuro comum e bom para todos? Bastaria preencher este hiato com assistencialismo e sentimentalismo? Não terá chegado o momento de repensar a convivência em nossas cidades e o nosso modo de trabalhar, de morar, de usar o dinheiro e planejar o lazer, de usar da natureza
E não basta! Há um fator comum que aproxima os jovens provenientes destes contextos desenraizados e os jovens aparentemente integrados aos contextos urbanos consumistas atuais: que tipo de “alimento” foi fornecido a suas mentes e corações pelo processo “educacional” que vivenciaram? A mentalidade que se formou a partir dos “profetas” da dissolução do humanismo moderno – como Nietzsche, Heidegger, Foucault – conseguiu estimular uma visão positiva da liberdade e dar as razões para a solidariedade ou acabou levando à concepção que, de fato, a morte e o nada seriam as únicas alternativas possíveis? Uma vez destruídas as culturas de matriz cristã que inspiraram o humanismo ocidental, qual seria a alternativa, quais os projetos de vida possíveis para estes jovens a quem foi dito que a vida humana é “para a morte”? A morte é o trágico nexo entre os imames radicais e as “pregações” dos “profetas pós-modernos”, os quais não sabem e não podem oferecer a estes jovens alternativas reais para que suas vidas sejam construídas com uma esperança de bem, de amor, de verdade, de justiça. Professores, por favor, nos perguntemos: como alimentamos a alma dos nossos jovens?
Que tipo de humanismo professam os grandes porta-vozes do humanismo ateu do ocidente? O grande Henri De Lubac em O drama do humanismo ateu, escrito em 1943, já preconizava o “grande desvio” da humanidade ocidental que pela escolha e pela ação de parte considerável de seus pensadores, renegara suas origens cristãs e afastara-se de Deus [1]. Segundo ele, a recusa de Deus levaria à destruição da pessoa humana e a uma escravatura espiritual e social; seria origem da “desordem que engendra as tiranias e os crimes coletivos e se exprime pelo fogo, pelas ruínas e pelo sangue” [2].
“Eu vim para destruir”: as figuras dos jovens terroristas niilistas – que Dostoiévski, genialmente, delineia em seu Os Demônios – expressam o produto da formação niilista [3]. Estas figuras literárias criadas pelo escritor russo não estariam anunciando a história do jovem idealizador belga-marroquino do ato terrorista de Paris? De família abastada de comerciantes, tendo estudado em boas escolas, inclusive num colégio católico na Bélgica, o que o teria levado a buscar no ISIS um projeto de vida e de morte, para si e para tantos outros que a ele destinou com seu ato terrorista? A destruição, a aniquilação se torna o projeto de vida possível a um jovem a quem não foi oferecido o alimento da esperança, da justiça, da verdade, do bem, do amor. E não estaria este destino já anunciado também no “Período do Terror”, uma das fases pela qual passou a Revolução Francesa (tão louvada em nossos manuais escolares de história), demonstrando a fragilidade dos ideais como a liberdade, a igualdade e a fraternidade, quando foram rechaçadas suas matrizes cristãs?
Não teria chegado a hora de revermos profundamente os fundamentos e a capacidade efetiva de realização dos ideais do projeto histórico que, iniciado na Modernidade, parece ter um trágico desfecho em nossa Pós-Modernidade? Se é verdade que o mundo se globalizou, não podemos negar que essa globalização exportou e exporta os frutos desse seu projeto no mundo inteiro...
Famílias, educadores e escolas: não seria o momento de se questionar acerca dos conteúdos que oferecemos a estes jovens e que alimentam suas almas? Será suficiente oferecer a eles sucesso na prova vestibular; boa inserção no mercado de trabalho; boa possibilidade de poder aquisitivo; lazer, boa comida e bons aparelhos eletrônicos? Isto bastará para oferecer a eles, um projeto de vida e não de morte para si e para os outros? Edith Stein apontou em sua obra Estrutura da pessoa humana [4] que a força psíquica e espiritual do ser pessoal demanda alimentos como um diálogo amigo, uma leitura significativa, uma bela música ou um bom filme: tudo isto constrói o humano; ao passo de que o contrário, ou a falta, o destrói.
Chegou a hora, esperando que não seja demasiado tarde, de parar nossa corrida eficientista e irrefletida e pensar e decidir o que queremos para os nossos jovens, o que queremos para o nosso futuro.
Irã, Iraque, Mali, Nigéria e outros países da África e do Oriente Médio são locais onde as grandes potências mundiais que lideram a sociedade ocidental pós-moderna exerceram (e procuram continuar exercendo) uma exploração sistemática dos recursos naturais e humanos, herdeira dos antigos colonialismos, se apossando de ouro, petróleo, urânio, minerais e terras; e depois da força de trabalho das populações que, obrigadas a emigrar pelas condições de depauperamento geradas pela referida exploração, vivem nas grandes periferias urbanas do Ocidente.
Algo semelhante acontece no Brasil, onde a migração forçada pela pobreza e pela exploração gerou os bolsões de miséria nas periferias de nossas grandes cidades, onde favelas e cortiços coexistem com condomínios fechados de alto padrão, impenetráveis e soberbos em sua imponência; onde alguns jovens frequentam locais de lazer de luxo e compram em shoppings enquanto outros vivem de modo desumano ou jazem em ruas e praças destruídos pelo uso do crack. Não seria este entrincheiramento em nome da segurança e do bem-estar algo análogo ao entrincheiramento de vários países da União Europeia que ergueram barreiras para não receber imigrantes e refugiados? Que oportunidades de convivência e reciprocidade criaram para que estes jovens pudessem pensar e atuar para um futuro comum e bom para todos? Bastaria preencher este hiato com assistencialismo e sentimentalismo? Não terá chegado o momento de repensar a convivência em nossas cidades e o nosso modo de trabalhar, de morar, de usar o dinheiro e planejar o lazer, de usar da natureza
E não basta! Há um fator comum que aproxima os jovens provenientes destes contextos desenraizados e os jovens aparentemente integrados aos contextos urbanos consumistas atuais: que tipo de “alimento” foi fornecido a suas mentes e corações pelo processo “educacional” que vivenciaram? A mentalidade que se formou a partir dos “profetas” da dissolução do humanismo moderno – como Nietzsche, Heidegger, Foucault – conseguiu estimular uma visão positiva da liberdade e dar as razões para a solidariedade ou acabou levando à concepção que, de fato, a morte e o nada seriam as únicas alternativas possíveis? Uma vez destruídas as culturas de matriz cristã que inspiraram o humanismo ocidental, qual seria a alternativa, quais os projetos de vida possíveis para estes jovens a quem foi dito que a vida humana é “para a morte”? A morte é o trágico nexo entre os imames radicais e as “pregações” dos “profetas pós-modernos”, os quais não sabem e não podem oferecer a estes jovens alternativas reais para que suas vidas sejam construídas com uma esperança de bem, de amor, de verdade, de justiça. Professores, por favor, nos perguntemos: como alimentamos a alma dos nossos jovens?
Que tipo de humanismo professam os grandes porta-vozes do humanismo ateu do ocidente? O grande Henri De Lubac em O drama do humanismo ateu, escrito em 1943, já preconizava o “grande desvio” da humanidade ocidental que pela escolha e pela ação de parte considerável de seus pensadores, renegara suas origens cristãs e afastara-se de Deus [1]. Segundo ele, a recusa de Deus levaria à destruição da pessoa humana e a uma escravatura espiritual e social; seria origem da “desordem que engendra as tiranias e os crimes coletivos e se exprime pelo fogo, pelas ruínas e pelo sangue” [2].
“Eu vim para destruir”: as figuras dos jovens terroristas niilistas – que Dostoiévski, genialmente, delineia em seu Os Demônios – expressam o produto da formação niilista [3]. Estas figuras literárias criadas pelo escritor russo não estariam anunciando a história do jovem idealizador belga-marroquino do ato terrorista de Paris? De família abastada de comerciantes, tendo estudado em boas escolas, inclusive num colégio católico na Bélgica, o que o teria levado a buscar no ISIS um projeto de vida e de morte, para si e para tantos outros que a ele destinou com seu ato terrorista? A destruição, a aniquilação se torna o projeto de vida possível a um jovem a quem não foi oferecido o alimento da esperança, da justiça, da verdade, do bem, do amor. E não estaria este destino já anunciado também no “Período do Terror”, uma das fases pela qual passou a Revolução Francesa (tão louvada em nossos manuais escolares de história), demonstrando a fragilidade dos ideais como a liberdade, a igualdade e a fraternidade, quando foram rechaçadas suas matrizes cristãs?
Não teria chegado a hora de revermos profundamente os fundamentos e a capacidade efetiva de realização dos ideais do projeto histórico que, iniciado na Modernidade, parece ter um trágico desfecho em nossa Pós-Modernidade? Se é verdade que o mundo se globalizou, não podemos negar que essa globalização exportou e exporta os frutos desse seu projeto no mundo inteiro...
Famílias, educadores e escolas: não seria o momento de se questionar acerca dos conteúdos que oferecemos a estes jovens e que alimentam suas almas? Será suficiente oferecer a eles sucesso na prova vestibular; boa inserção no mercado de trabalho; boa possibilidade de poder aquisitivo; lazer, boa comida e bons aparelhos eletrônicos? Isto bastará para oferecer a eles, um projeto de vida e não de morte para si e para os outros? Edith Stein apontou em sua obra Estrutura da pessoa humana [4] que a força psíquica e espiritual do ser pessoal demanda alimentos como um diálogo amigo, uma leitura significativa, uma bela música ou um bom filme: tudo isto constrói o humano; ao passo de que o contrário, ou a falta, o destrói.
Chegou a hora, esperando que não seja demasiado tarde, de parar nossa corrida eficientista e irrefletida e pensar e decidir o que queremos para os nossos jovens, o que queremos para o nosso futuro.
Notas:
[*] Detalhe da obra Unrooted tree, de Benoît Mangin et Marion Laval-Jeantet. Imagem extraída de: <http://www.luxuriant.lu/wp-content/uploads/2013/04/Roue.jpg>.
[1] DE LUBAC, Henri. O drama do humanismo ateu. Porto: Porto Ed., 1944, p. 7.
[2] DE LUBAC, Henri. O drama do humanismo ateu. Porto: Porto Ed., 1944, p. 22.
[3] DOSTOIÉVSKI, Fiódor. Os Demônios. São Paulo: Ed. 34, 2004.
[4] Cf. STEIN, Edith. Estructura de la persona humana (pp. 555-752). In: STEIN, Edith. Obras Completas, VI: Escritos antropológicos y pedagógicos (Magisterio de vida Cristiana, 1926-1933). Vitoria/Madrid/Burgos: El Carmen/Espiritualidad/Monte Carmelo, 2003.
[2] DE LUBAC, Henri. O drama do humanismo ateu. Porto: Porto Ed., 1944, p. 22.
[3] DOSTOIÉVSKI, Fiódor. Os Demônios. São Paulo: Ed. 34, 2004.
[4] Cf. STEIN, Edith. Estructura de la persona humana (pp. 555-752). In: STEIN, Edith. Obras Completas, VI: Escritos antropológicos y pedagógicos (Magisterio de vida Cristiana, 1926-1933). Vitoria/Madrid/Burgos: El Carmen/Espiritualidad/Monte Carmelo, 2003.
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