No complexo contexto atual, é importante julgarmos criticamente os rumos que estamos dando a certas questões de grande impacto ao futuro do País. No Evangelho de São Mateus, o apóstolo de Cristo relata uma passagem em que o Senhor lhe ensina a distinguir verdadeiros de falsos profetas. Jesus diz: “Vocês os reconhecerão pelos seus frutos.” E continua, explicando: “Por acaso, pode alguém colher uvas de um espinheiro ou figos de ervas daninhas? […] A árvore boa não pode dar frutos ruins, nem a árvore ruim pode dar frutos bons” (Mt 7,15-20).
O Brasil vê-se, hoje, diante de dramáticas e equivocadas propostas com relação ao financiamento da ciência, tecnologia e educação. É preciso contrapô-las e revertê-las agora, para evitar danos irreparáveis que comprometerão o desenvolvimento da nossa sociedade, sua capacidade de responder aos inúmeros e imprevistos desafios que se lhe apresentarão no século XXI, e sua posição como um ator relevante e positivo no cenário internacional.
Os sucessivos cortes e contigenciamentos nos investimentos, que têm ocorrido nos últimos anos, sem sinais de reversão, já deixaram sua marca, desmontando laboratórios e grupos de pesquisa, espantando profissionais qualificados e enfraquecendo nosso sistema de formação acadêmica. É claro que qualquer despesa pública deve ser equacionada num cenário limitado de recursos, mas os custos com esses itens do orçamento devem ser vistos a partir da lógica do investimento, e não da despesa.
O mais contundente risco ao futuro do Brasil está nas recentes ameaças ao financiamento da educação superior. Na raiz das respostas para a estagnação econômica e muitos dos problemas sociais e estruturais com os quais nos confrontamos (cada vez mais integrados num único ecossistema global), não estão soluções resultantes automática ou inevitavelmente de simples ajustes fiscais, mas pessoas capazes de empreender com liberdade e de maneira inovadora, inclusive na fronteira do conhecimento. Tais atores são formados nas universidades de qualidade e engajados diretamente na reflexão acadêmica e na pesquisa científica.
A educação STEM (sigla em Inglês para Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) é um ponto central de sustentação do progresso de nosso País e precisa ser estimulada e fomentada. Para resgatar a metáfora evangélica inicial, “stem”, em Inglês, não por acaso, significa tronco. Devemos, rapidamente, voltar a afirmá-la como um pilar para o nosso desenvolvimento.
Mas não podemos, sob hipótese alguma, valorizar as disciplinas científicas e tecnológicas em detrimento das humanidades, como certas manifestações do governo sugeriram recentemente, sob o risco de comprometer o futuro do País. Apesar da nossa imagem moderna de progresso estar excessivamente associada às conquistas tecnológicas, o avanço integral do conhecimento (ou seja, ciência como parte de uma cultura) depende de maneira simbiótica das Ciências Humanas. Largados a si mesmos, os fatos científicos são privados de significado profundo e de um sentido amplo. Transformá-los em conhecimento que possa construir, além de ferramentas, uma sociedade e criar caminhos para novas descobertas e desenvolvimentos depende da capacidade de julgá-los criticamente, sintetizá-los e analisá-los num contexto cultural abrangente e pensá-los de maneira integral. São a Filosofia, a Arte e as Ciências Humanas em geral que nos educam a este uso da razão total. Diminuí-las seria retirar a luz, decretar noite eterna à árvore do conhecimento.
Ulisses Barres de Almeida
(*) Pomar de oliva com um homem e uma mulher colhendo frutas
Vicent Van Gogh Dezembro de 1889
Museu Kröller-Müller, Otterlo, Holanda
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