«Sem perseguir com constância,
empenho e inteligência o bem comum, nem mesmo os indivíduos podem aproveitar
seus direitos e alcançar suas mais nobres aspirações, porque faltaria o espaço
ordenado e civilizado em que viver e operar " (Papa Francisco, discurso
para a cidade de Cesena. Italia)
Estas palavras do Papa Francisco
iluminam também os atuais desafios da vida política do Brasil.
É questão crucial a construção desse
espaço a que o Papa Francisco se refere.
Em
primeiro lugar, cada ser humano carrega em si “nobres aspirações”, afirma o
Papa: a estima por si e pelo outro nasce do reconhecimento deste ser que cada
um é: ser humano. Sujeito portador de
exigências e evidências constitutivas que movem cada um em sua relação com a
realidade; e também movem os povos em busca de sua felicidade, como Giussani
lembra em “O senso religioso”. A
afirmação do ser pessoal do homem iniciou na tradição do Ocidente pelo
reconhecimento dessa característica propriamente humana. Em um dos documentos
fundantes da filosofia grega, o diálogo do Fedon, Sócrates lembra a seus
interlocutores que a busca da beleza, da verdade, da justiça, do amor são as
evidencias que o ser humano é dotado de uma alma racional, que transcende a
corporeidade, e que o diferencia dos demais seres vivos. Se faltar essa estima
para si e para o outro, não é possível construir um mundo humano.
Mas
isto não é suficiente.
Com efeito, apesar de cada um buscar a
realização de suas aspirações autênticas, de paz, justiça, verdade, etc ,
através de todas as ações, seja privadas ou públicas e percorrendo diferentes
caminhos, não podemos ingenuamente
pensar que alcançaremos esse objetivo “ sem perseguir com constância,
compromisso e inteligência, o bem comum”. As dificuldades, incompreensões, confusões,
etc que permeiam a vida social e
política do Brasil nestes tempos, põem isto em grande evidencia.
É preciso de âmbitos onde as aspirações de cada um possam se apoiar numa
rede de relações humanas e sociais em que a pessoa possa ter consciência de si
mesma, de suas necessidades e de seus direitos. O bem comum é o terreno para a construção de
um espaço autenticamente político na sociedade: um “espaço ordenado e
civilizado”.
Mais uma vez, a filosofia grega
mostrou para a humanidade que o ser propriamente humano precisa de um espaço em
que sua vida possa ser afirmada: a polis.
Sem a cura e a valorização das
relações que constituem as pessoas num povo, não há possibilidade também de
valorização dos indivíduos, nem de afirmação e preservação de seus
direitos. O grande desafio neste momento
é cuidar de preservar e de educar uma dimensão que é constitutiva da vida de um
País e que demanda a corresponsabilidade de cada um: um patrimônio de bem comum
a todos; e um método para construí-lo e preserva-lo: não a contraposição entre
ideologias, mas o dialogo entre sujeitos, pessoas e comunidades que sejam.
A Igreja no mundo, e no Brasil, se
propõe, ontem como hoje, como o lugar educativo para esse diálogo, para essa
construção. Se o Brasil apesar de toda a
violência que atravessou e atravessa sua história, apesar de todas as
diferenças entre suas componentes étnicas, sociais, culturais, etc. se
constituiu como um povo, o devemos a
essa presença a que os missionários deram carne, desde o século XVI. Hoje,
temos que dar continuidade a esse caminho.
Pois sabemos que ele carrega em si, no tempo humano, uma indomabilidade,
uma criatividade e uma capacidade de acolhida e de misericórdia, que lhe vem do
próprio Deus. Assim poderemos
testemunhar aquela “constância, empenho e inteligência” a que Papa Francisco
nos convoca.
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