Nas últimas semanas, o Brasil e o mundo estão lidando com o surto do vírus Zika e sua provável associação com a microcefalia. Surto que foi declarado ser epidemia mundial, cuja rápida difusão deve-se também ao descuido que, ao longo de anos, as autoridades sanitárias mundiais tiveram diante dos primeiros sinais da presença do vírus em vários países da África e na Índia. A primeira identificação do vírus ocorreu na Uganda, na Floresta Zika, no longínquo ano de 1947. Agora várias nações do mundo estão correndo para minorar o tempo perdido, diante do fato do vírus estar afetando de maneira maciça diversos países, dentre os quais, em primeiro lugar, o Brasil às vésperas dos Jogos Olímpicos. E, nesse momento, se tem discutido e pesquisado mais pontualmente sua correlação ainda hipotética com a microcefalia.
Mas é justamente neste oportuno e necessário cuidado, que surgem os que aproveitam para levantar bandeiras ideológicas que não nascem de uma real preocupação com as pessoas: referimo-nos à declaração do Alto Comissário de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, Zeid Ra’ad Al Hussein que, recentemente, apelou para que, nos países afetados pelo vírus, as mulheres tenham pleno acesso aos métodos contraceptivos e ao aborto [1]. Evidentemente a declaração foi rechaçada por vários países, incluindo o Brasil e pelo Vaticano [2]. A Conferência Episcopal da Colômbia afirmou que é preciso exterminar o vírus e não as crianças inocentes [3]. Mas, não demorou para que a declaração emanada do Escritório do Alto Comissariado tivesse os efeitos desejados: já se fala de um caso em que uma gestação de 32 semanas foi interrompida em função do diagnóstico de vírus Zika em uma gestante francesa, contaminada pelo vírus em 2015, quando esteve em visita ao Brasil.
O virologista Carlo Federico Perno, docente da Universidade Tor Vergata de Roma, afirmou numa entrevista:
O que mais surpreende, para além da inconsistência da proposta que desresponsabiliza as autoridades sanitárias e políticas competentes no que diz respeito às ações de prevenção, pesquisa e terapia da doença, é que o autor da declaração pertence a um país, a Arábia Saudita, que não é, certamente, o exemplo melhor de respeito aos Direitos Humanos. Ali, o valor e a integridade da pessoa humana são constantemente ameaçados: é o quarto país no mundo em número de execuções capitais; e são constantes as violações dos direitos das mulheres, dos homossexuais, da liberdade de expressão e de religião. No âmbito desta lógica, pode ser coerente a declaração de Zeid Ra’ad Al Hussein. Mas, causa espanto o fato de que um organismo internacional como a ONU tenha escolhido um representante daquele país justamente para o cargo de Alto Comissariado de Direitos Humanos [5].
Mas é justamente neste oportuno e necessário cuidado, que surgem os que aproveitam para levantar bandeiras ideológicas que não nascem de uma real preocupação com as pessoas: referimo-nos à declaração do Alto Comissário de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, Zeid Ra’ad Al Hussein que, recentemente, apelou para que, nos países afetados pelo vírus, as mulheres tenham pleno acesso aos métodos contraceptivos e ao aborto [1]. Evidentemente a declaração foi rechaçada por vários países, incluindo o Brasil e pelo Vaticano [2]. A Conferência Episcopal da Colômbia afirmou que é preciso exterminar o vírus e não as crianças inocentes [3]. Mas, não demorou para que a declaração emanada do Escritório do Alto Comissariado tivesse os efeitos desejados: já se fala de um caso em que uma gestação de 32 semanas foi interrompida em função do diagnóstico de vírus Zika em uma gestante francesa, contaminada pelo vírus em 2015, quando esteve em visita ao Brasil.
O virologista Carlo Federico Perno, docente da Universidade Tor Vergata de Roma, afirmou numa entrevista:
Pensar em fazer o aborto com todas as mulheres grávidas nos Trópicos, que potencialmente poderiam ter contraído o vírus e que, mesmo assim, apenas potencialmente poderiam dar vida a uma criança com microcefalia, uma doença de gravidade variável, é uma loucura e fora de qualquer razão científica. Se acrescentarmos que as mulheres envolvidas seriam centenas de milhares, como evidenciado pelas altas taxas de natalidade desses países, isso significaria que lhes permitiriam praticar uma operação de aborto em massa. E apenas a partir de uma hipótese não verificada. Qual médico com um pouco de raciocínio faria uma escolha semelhante? (...) Geralmente eu acredito que um médico não deve causar a morte a qualquer ser humano doente, mas neste caso é ainda mais louco, porque se corre o risco de matar milhões de crianças saudáveis. Parece uma operação ideológica planejada para legalizar o aborto em países que proíbem isso [4].
O que mais surpreende, para além da inconsistência da proposta que desresponsabiliza as autoridades sanitárias e políticas competentes no que diz respeito às ações de prevenção, pesquisa e terapia da doença, é que o autor da declaração pertence a um país, a Arábia Saudita, que não é, certamente, o exemplo melhor de respeito aos Direitos Humanos. Ali, o valor e a integridade da pessoa humana são constantemente ameaçados: é o quarto país no mundo em número de execuções capitais; e são constantes as violações dos direitos das mulheres, dos homossexuais, da liberdade de expressão e de religião. No âmbito desta lógica, pode ser coerente a declaração de Zeid Ra’ad Al Hussein. Mas, causa espanto o fato de que um organismo internacional como a ONU tenha escolhido um representante daquele país justamente para o cargo de Alto Comissariado de Direitos Humanos [5].
Notas
[1] HUMAN RIGHTS OFFICE OF THE HIGH COMMISSIONER (HROHC). Upholding women’s human rights essential to Zika response – Zeid. News and Events, 5 de fevereiro de 2016. Disponível aqui. Acesso em 8 fev. 2016.
[2] MICROCEFALIA faz ONU defender acesso ao aborto; Brasil manterá veto. O Estado de São Paulo, 6 de fevereiro de 2016, p. A12; CONDOMINAS, Baptiste. Zika: l’Eglise face à la question de l'avortement en Amérique latine. RFI, 10 de fevereiro de 2016. Disponível aqui. Acesso em 10 fev. 2016; REDACTION. Zika : l'Eglise brésilienne rejette l'avortement pour les cas de microcéphalie. FranceInfo, 11 de fevereiro de 2016. Disponível aqui. Acesso em 11 fev. 2016.
[3] Cf. FRIGERIO, Benedetta. Zika. Bisogna sterminare le zanzare, non i bambini innocenti. Tempi.it, 10 de fevereiro de 2016a. Disponível aqui. Acesso em 10 fev. 2016. Mas, confira também o testemunho de Ana Carolina Cáceres em TOMAZELA, José Maria. Jovem com microcefalia revela superação. O Estado de São Paulo, 2 de fevereiro de 2016, p. A13; e também FRIGERIO, Benedetta. Zika. La testimonianza della giornalista affetta da microcefalia: «Offesa da chi invoca l’aborto». Tempi.it, 11 de fevereiro de 2016b. Disponível aqui. Acesso em 11 fev. 2016.
[4] FRIGERIO, 2016a, tradução nossa. Vale lembrar também que a microcefalia pode ser constitucional, sem qualquer relação com dano neurológico. Ter a virose durante a gestação não implica necessariamente em acometimento do feto, de forma que, como bem disse o virologista italiano, não se justifica em nada a afirmativa daquele organismo que deveria “promover e proteger todos os direitos humanos”, segundo os “ideais universais da dignidade humana” (HROHC, 2016, tradução nossa).
[5] Cf. GROTTI, Leone. L’Arabia Saudita, alla disperata ricerca di boia, vuole la presidenza del Consiglio Onu per i diritti umani. Tempi.it, 20 de maio de 2015. Disponível aqui. Acesso em 10 fev. 2016.
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