quarta-feira, 18 de março de 2015

Jovens que fogem para o Estado Islâmico: a busca radical do absoluto e o esgotamento do relativismo e do niilismo modernos

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As três jovens britânicas de cerca de 15 anos que foram atrás dos bárbaros do Estado Islâmico [1] nos indicam que a cultura de onde vêm está desmoronando. Não tem mais sabor, o fascínio de um tempo. Não tem mais nada a dizer a elas. O que buscam indo à Síria? Algo que, para elas, é mais importante do que salvaguardar a própria vida, como acontece com os homens e mulheres bomba.
Estamos assistindo ao declínio do sofisma moderno.  Há cerca de 2500 anos, na Grécia antiga, o sofista Protágoras já dizia que “o homem é a medida de todas as coisas”. Sócrates debateu com ele e derrubou seus argumentos ao mostrar sua inconsistência filosófica e ao afirmar que a única explicação razoável para o mundo e tudo o que existe é que “Deus é a medida de todas as coisas”. Mas apesar do resultado dessa batalha filosófica ter sido aceito por milênios, a história mostra que o fascínio do sofisma retorna em momentos de crise e perda profunda de referências. De fato, Nietzsche, um amante dos sofistas, afirma numa sequência lógica inquestionável: se o homem é a medida de todas as coisas, Deus morreu (não há outro princípio além do próprio homem); e se Deus morreu, tudo é permitido.
Enquanto Protágoras é o fundador do relativismo (cada ser humano é a origem da sua verdade e esta é subjetiva), seu sucessor Górgias, introduz a posição niilista pela primeira vez. Para ele é impossível provar que algo de fato existe (e não passa de uma impressão subjetiva minha); e mesmo que existisse não se pode ter certeza de que possa ser conhecido, ou seja, compreensível; e mesmo se fosse compreensível não seria comunicável nem explicável aos outros. Entramos no mundo da solidão e da incomunicabilidade! Na continuação há ainda um terceiro grupo de sofistas, representado por Pródico de Céos que avança nessa mesma lógica e conclui: se eu sou o princípio, tudo o que me é útil e me dá prazer é bom, além de ser preciso fazer de tudo para evitar a dor.
Não nos são familiares estas proposições? Nossa cultura pós-moderna repete, com uma aura de progressismo e liberalismo, os argumentos e as posições dos sofistas da Grécia antiga. Imagina-se que isso trará mais liberdade e mais humanidade ao gênero humano, cansado de intolerância, repressão e guerras.  Mas, se é assim, como explicar aqueles jovens que vão atrás do Estado Islâmico? Eles não são apenas casos isolados, são “a ponta do iceberg”, aqueles casos extremos que revelam a existência de uma crise cultural muito mais ampla. O relativismo e o niilismo modernos, não conseguiram ter a última palavra sobre o ser humano. Os jovens, sobretudo estes, estão correndo atrás de alternativas que sejam absolutas, pois seu coração vive da busca de um absoluto, maior do que o ser humano e melhor do que a sua condição sobre a terra. Esta busca pelo absoluto sempre foi dramática, pois nela se joga o sentido da vida humana e da realidade. O relativismo e o niilismo modernos tentaram eliminar este drama, mas o que fizeram na verdade é conduzir à tragédia de vidas sem sentido ou de um falso absoluto que nega o valor da própria vida.
 
Ana Lydia Sawaya
 
Nota:
[*] MUNCH, Edward. O grito, 1895.
[1] FALCÃO, Catarina. As três adolescentes britâncias já terão chegado à Síria e ao Estado Islâmico. Observador, do dia 22 de fevereiro de 2015. Disponível em: <http://observador.pt/2015/02/22/as-tres-adolescentes-britanicas-ja-terao-chegado-a-siria-e-ao-estado-islamico/>. Acesso em: 05 mar. 2015
 
 

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