quarta-feira, 5 de abril de 2017

O canto que é experiência da fé

Às vésperas da Semana Santa de 2017, propomos mais esse texto de Luigi Giussani, tirado da Coleção Spirto Gentil. E, com Giussani, dizemos: "Que estes cantos, com o fascínio de sua beleza e verdade, com a facilidade com a qual provocam a comoção, introduzam o nosso coração estavelmente, eduquem o nosso coração à consciência da Sua Presença, à vibrante percepção do Seu amor por nós e o abram à resposta".



Por Luigi Giussani
Que impacto de beleza e de verdade nos dão estes cantos! [1] Que intensa e viva devoção provocam em nós. Comovem, movem a uma piedade sincera e profunda. A pietas filipina é a única verdadeira pietas popular do século XVI. São Filipe Neri soube suscitar um espírito religioso autêntico. E, de fato, estes cantos são a expressão de um coração profundíssimo e ao mesmo tempo simplicíssimo.

Desde o início da nossa história, cantamo-los e nos deixamos acompanhar por essa sensibilidade, que logo reconhecemos como fator educativo do nosso coração pelo frescor, vivacidade e verdade com que palavras e música favorecem a imaginação e a identificação, tornam vivas diante dos olhos as figuras de Jesus e de Nossa Senhora, acordam a consciência, dão palavras, voz e sons ao nosso coração, ao nosso pedido.

O canto tem esta característica:  não deixa nada em um nível puramente intelectual. Ouvir o Amém da Ave Maria, de Victoria, ou o choque inicial de Cristo al morir tendea é uma emoção, por isso as palavras nos são menos estranhas. O canto favorece uma certa emoção, por isso se torna mais fácil introduzir-se no significado daquelas palavras; torna-se mais fácil a oração. Cantar se torna a experiência da fé.
Estes cantos dão voz ao coração todo do homem, favorecendo a sua justa ordenação. Por isso, nos acompanharam desde o início, quando, na primeira missa do Movimento [de Comunhão e Libertação], cinco minutos antes de começar, ensinei O côr soave. Através deles, Cristo, companheiro do nosso caminho, fonte da nossa esperança, cotidianamente destrói, contesta a limitação do nosso respiro, vence o “ataque” à nossa capacidade de respirar, de ver o infinito que se esconde atrás do rosto de cada coisa que tocamos. Quando cantamos O côr soave, nós temos compaixão por aquilo que coube a Ele viver, porque é por nós homens que o Seu coração foi transpassado!
Quais peças, mais do que estas, junto aos Responsórios, de Victoria [confira aqui], introduzem-nos no mistério da Semana Santa, no mistério da Redenção?
Cristo al morir tendea: o vemos com os olhos! Cristo al morir tendea: toda a sua vida. Então entendo que o pecado é a ausência desse tender, dessa tensão, dessa elementar imitação da figura de Cristo “tendido a”. É a falta dessa tensão: não de tensão moral no sentido de desejo, de tendência, também, ao bem, à virtude. É uma mentira, é uma ilusão, é um equívoco a tensão ao bem, ao valor, à virtude se não é tensão ao sacrifício inerente.
A perfeição de um afeto, a perfeição de um trabalho, a perfeição de uma oração, a perfeição de um esforço, de uma obrigação, a perfeição de um relacionamento, de qualquer natureza e tipo, coincide ou depende da tensão ao sacrifício inerente. Sem sacrifício não existe verdade no relacionamento.
Que estes cantos, com o fascínio de sua beleza e verdade, com a facilidade com a qual provocam a comoção, introduzam o nosso coração estavelmente, eduquem o nosso coração à consciência da Sua Presença, à vibrante percepção do Seu amor por nós e o abram à resposta.
Notas:
[1] CHIERICI, Sandro; GIAMPAOLO, Silvia (orgs.). Spirto gentil: um invito all’ascolto dela grande musica guidati da Luigi Giussani. Milão: BUR Rizzoli, 2011, p.500-502. Traduzido sem revisão dos autores por Fábio Henrique Viana.

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