sábado, 24 de agosto de 2019

Rezar pela Amazônia e defender a Vida no Planeta!



"A criação geme e sofre as dores de parto" (Rm 8,22).

As notícias e imagens dos devastadores incêndios que destroem a floresta amazônica causaram perplexidade, tristeza e indignação diante de um crime ambiental de proporções alarmantes, com consequências imprevisíveis e danos que podem tornar-se irreparáveis e irreversíveis.

Tais fatos e sua repercussão mundial envergonham o Brasil e os brasileiros. Chefes de Estado e governantes de diversas nações expressaram sua preocupação e veemente reprovação. Cidadãos no Brasil e no exterior se unem em manifestações populares para mostrar que a defesa da vida humana e do bem comum passa pelo cuidado com o Planeta Terra, que o Papa Francisco denomina na Encíclica Laudato Si' de "casa comum".

Sim, o Planeta é a "casa comum" e a preservação da floresta amazônica, com suas árvores, seus animais e sua rica biodiversidade não diz respeito só ao Brasil, mas é direito e dever de toda a humanidade. O que está em jogo é o oxigênio que se respira, a água a que todos têm direito, o ciclo natural das chuvas, a preservação das espécies e a sustentabilidade da vida no Planeta.
Denunciar a devastação e ocupar-se da preservação da Amazônia não representa ameaça à soberania; pelo contrário, o que a ameaça é a ganância, a insensatez e o retrocesso que os brasileiros estão assistindo nos dias atuais, especialmente corroborado pelas lamentáveis declarações de autoridades governamentais.

É momento de rezar, tomar consciência, assumir um processo interior de conversão, resgatar os verdadeiros valores, isto é, um modo de agir sóbrio e coerente. É a hora de exercer a cidadania por meio de atitudes nobres, firmes e corajosas, na vida pessoal e social, que comprovem uma real e eficaz mudança de comportamento em favor da vida, da justiça, da paz e de um mundo ecologicamente sustentável.

Nota : trecho da carta enviada por Dom Pedro Luiz Stringhini, bispo de Mogi das Cruzes à sua diocese, em 23 de agosto de 2019

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Em defesa da Universidade


Estão em pauta várias questões ligadas à gestão, à autonomia e à identidade das universidades públicas. A proposta pelo MEC do Programa Futura-se prevê a autonomia financeira das universidades através de captação de dinheiro por meio de parcerias público-privadas, cessão de prédios, lotes e até a criação de fundos para autonomia financeira. Tem sido feitas várias tentativas dos poderes políticos federais e estaduais de ingerência nas decisões e na gestão da vida universitária, tais como a escolha de reitores e gestores. A falta de repasse das verbas do Ministério da Ciência para o Centro Nacional de Pesquisa (CNPq) paralisou a concessão de bolsas e auxílios para pesquisa e eventos científicos.
Ligada a esses fatos, se difundiu no Brasil uma visão negativa das universidades públicas, veiculada principalmente pela ideologia de Olavo de Carvalho e seus seguidores. Carvalho crítica abusivamente as universidades, pois para ele seriam meros lugares de aparelhamento ideológico, especialmente do PT. Eis alguns exemplos de suas postagens:
Universidades, no Brasil, são, em primeiro lugar, pontos de distribuição de drogas. Em segundo, locais de suruba. A propaganda comunopetista fica só em terceiro lugar. (11 de março de 2019).
As universidades brasileiras não têm mais conserto. Têm de ser, como já estão sendo passadas para trás pelos cursos particulares mais sérios. Meus próprios alunos já fundaram alguns desses cursos, que juntos vão formando aos poucos a ÚNICA universidade brasileira digna desse nome. Continuem fazendo o bom trabalho e daqui a dez anos um diploma da USP, da PUC ou da UNICAMP -- exceto em algumas raras áreas técnicas -- só servirá como garantia de desemprego. (6 junho 2016)
O Brasil não tem tradição universitária. Ele tem, ao contrário, uma tradição das faculdades isoladas, que, por não poderem exercer esta função mais elevada, acabavam virando centros de agitação política. O tempo que os estudantes perderam fazendo passeatas e revoluções foi tempo roubado à formação da elite intelectual nacional. A desvantagem que o Brasil leva no cenário internacional ocorre simplesmente pelo despreparo e pela burrice da sua elite política. Em vez de estudar, ficavam fazendo passeata. Hoje, temos como resultado esse Congresso de analfabetos. (2001, entrevista).
Olavo de Carvalho vive fora do Brasil e pode dar-se ao luxo de desprezar o espaço universitário público que se constituiu no País; mas o mesmo não podem fazer os milhões de brasileiros que vivem no País. Todas as informações acima são falsas e tendenciosas, com uma intenção muito forte de chamar a atenção sobre si e sobre as suas plataformas político-partidárias. Basta ver os números de publicações científicas crescentes, o número de doutores formados e atuantes, e tantos outros indicadores. Do trabalho desenvolvido nas universidades de tantas formas e maneiras, todos os brasileiros tem-se beneficiado. Como por exemplo as tecnologias de produção para etanol desenvolvidas no Brasil pela primeira vez. O melhoramento na produção de frutas, verduras, carne animal, etc. O desenvolvimento de vacinas, e novos medicamentos para inúmeras doenças. A grande contribuição que têm dado para o mundo a literatura, a arte, e a música brasileira, assim como a pesquisa nessas áreas. Mesmo os que pensam que Carvalho diz a verdade vão ao posto de saúde tomar vacinas, usam recursos da informática desenvolvidos aqui, buscam alimentos mais saudáveis desenvolvidos pelos centros de pesquisa em agricultura, se beneficiam de soluções desenvolvidas contra a degradação urbana e ambiental, gosam dos benefícios dos avanços em direitos humanos e para superação da pobreza desenvolvidos no Brasil e na vanguarda de muitos países (só lembrar as políticas de saúde desenvolvidas para o combate à disseminação da AIDS). Tudo isto tem a ver com universidade e o trabalho desenvolvido nela.
O desmonte da Universidade, portanto, implicaria um retrocesso do País cujas graves consequências para as futuras gerações seriam incalculáveis. Apesar da instituição universitária como tal remontar no Ocidente aos inícios do primeiro milênio, a universidade pública brasileira é uma instituição com um passado relativamente curto. Desde a expulsão da Companhia de Jesus e a extinção de sua rede de ensino no território nacional, até a criação das primeiras faculdades em 1827 e das primeiras universidades no início do século XX, os filhos da elite brasileira eram enviados para estudar no exterior. Dessa forma, grande parte da população só tinha acesso a formas de ensino doméstico, ou era autodidata, sem estrutura, sem financiamento e sem condições de oferecer oportunidades de transformação social. A consolidação da universidade brasileira e o seu fortalecimento cientifico no plano nacional e internacional pelo apoio de instituições de auxílio a pesquisa e capacitação docente (CNPq, Fapesp, Fapemig, Faperj, Capes, etc) é, portanto, uma grande conquista da história recente do País.
A acusação de Carvalho se aproveita da grave crise estrutural que avassala essas instituições no momento atual. E, ao invés de oferecer caminhos, opta pela via da destruição oportunista. Houve evidentemente erros de planejamento quanto à expansão das universidades públicas e na capacitação docente, houve excesso de gastos em função também de tentativas de aparelhamento ideológico ou por inaptidão na gestão; e há uma gravíssima crise econômica no País que evidentemente atinge também a comunidade universitária. Mas muitos professores estão trabalhando para encontrar soluções. Em 16 de agosto de 2019, o Reitor da Unesp Sandro Valentini afirmou:
Nos últimos anos, além da crise conjuntural que o País atravessa, também começou a se implantar nas universidades uma crise estrutural (..). Precisamos trabalhar juntos para encontrar uma solução para essa crise estrutural de financiamento, mas ao invés de tentar entender o problema e contribuir para a solução, muitos setores da sociedade preferiram construir uma narrativa negativa contra a autonomia de gestão e contra as universidades
Assim como o reitor da Unicamp, Marcelo Knobel reforçou a necessidade de:
mostrar de maneira mais efetiva, para os políticos e para a sociedade, o que a universidade de fato é e o que ela representa. Nós geramos empresas, nós atendemos a população em nossos hospitais, criamos cultura, inovação, oportunidades, isso sem contar a formação de recursos humanos que ocupam os cargos de liderança desse País.

Por isso tudo, nós reiteramos a todos os que amam o Brasil e que desejam ver a melhoria da vida nesta nação que acompanhem essas preocupações construtivas emitidas pelos reitores e rechacem as tentativas incendiárias de desqualificação e destruição do que foi construído pelas universidades brasileiras, por quem não vive aqui e escolheu outro país.